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Sábado, 20 de abril de 2024

11/09/2017 - 09h26min

Daniel Andriotti

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Brasil: teu passado te condena

Quinta-feira foi feriado. Feriado da Independência. Independência do Brasil que, antes, pertencia à colônia portuguesa. Quem acredita em regressão tem a convicção de que todas as mazelas do país são resultantes do nosso passado: fomos descobertos por um aventureiro português que, perdido em meio às suas cartas náuticas, veio ancorar – veja bem, na Bahia – sendo recebido por um bando de índios interesseiros que trocavam qualquer coisa por... espelhinhos, entre outras coisas...

Somente trezentos e vinte e dois anos depois desse fato é que veio ‘a tal da nossa independência’ de Portugal – daí o feriado da última quinta-feira. Ou seja, deixamos de ser uma província lusitana escravizada a partir do heroico brado, nem tão retumbante assim, conhecido por “Independência ou Morte” dado por Dom Pedro de Alcântara Orleans e Bragança às margens do Riacho do Ipiranga. Isso porque ele teria recebido uma carta com ordens de seu pai para que voltasse para Portugal se submetendo ao rei e às Cortes. Na verdade, eram três cartas. A segunda, assinada pelo ministro José Bonifácio, que o aconselhava a romper com Portugal e, uma terceira, da sua esposa, Maria Leopoldina, apoiando a decisão do ministro e convidando-o a discutir a relação. Dom Pedro I, na verdade, era um sósia do Tarcísio Meira, que mais tarde mudou-se para o bioma pampa assumindo o papel do Capitão Rodrigo Cambará.

Ironias a parte, espero que a história contada hoje nas escolas seja diferente daquela que aprendi lá no Otaviano no final da década de 70. Não que aquela estivesse errada. Muito pelo contrário. Refiro-me à riqueza de detalhes. E, de novo, a nossa situação enquanto país fracassado se explica. A versão que normalmente os professores contam nas aulas de história é a do cenário ilustrado pelo antológico quadro de óleo sobre tela, pintado pelo artista plástico Pedro Américo, que mostra um imperador Dom Pedro guerreiro, com cara de bravo, montado num belo cavalo alazão e erguendo altivo a sua espada com a mão direita, cercado da sua guarda de honra, também conhecida como “Dragões da Independência”. Por falar em dragões, não tem como olhar para a obra e não ver alguma semelhança com a imagem de São Jorge (aquele da Capadócia) espetando a lança no bicho...

Mas parece que a coisa não brilhou tão bem assim no céu da pátria nesse instante. Em primeiro lugar, as margens plácidas do riacho do Ipiranga não passavam de um esgoto a céu aberto, muito comum naquela época assim como se mantém muito comum até hoje pelo Brasil afora. Dom Pedro I montava, ao invés de um garanhão puro sangue, uma mula. Sim, uma mula, meio de transporte mais adequado para deslocamentos em grandes distâncias na serra do mar. Os vultosos “Dragões da Independência”, mal trapilhos e mal tratados, era uma espécie de “jagunços do rei”. E, agora vem o tiro de misericórdia: naquele fatídico 7 de setembro de 1822, Dom Pedro I enfrentava uma terrível infecção intestinal desde que sua comitiva havia partido de Santos. A impiedosa e tradicional “cólica fulminante”, se é que me entendem. Pra exemplificar: o infarto fulminante dá e a pessoa morre na hora. A cólica fulminante dá e a pessoa... deixa pra lá.

Portanto, imagine o mau humor de Pedro de Alcântara, desidratado pelo distúrbio intestinal, pelo lombo desconfortável da mula e pelo convite da esposa para discutir a relação. Logo, embora o fato não costume ser mencionado, a verdade é que uma violenta diarreia teve seu papel (ou a falta do outro, o higiênico) fundamental na independência do Brasil. Como nação, nascemos em meio a um churril do nosso primeiro rei. E agora vem o tiro de misericórdia: o tal do grito. Parece que, mesmo cambaleante (porque um filho teu não foge à luta), Dom Pedro I pegou sua espada e, sem forças para erguê-la, com as mãos trêmulas e as pernas bambas, teria dito meio desafinado: “...E nessa loucura, de dizer que não te quero, vou negando as aparências, disfarçando as evidências...”

Daniel Andriotti

[email protected]

Publicado em 9/9/2017.

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