29/01/2020 - 16h13min
Nascida em fevereiro, toda vez que o ensolarado janeiro se prepara para ir embora, começo a pensar no tempo que passa, feito cometa, carregando-me em sua cauda luminosa universo afora, curiosa por novidades e mala cheia de lembranças.
Penso naquele carnaval infantil no clube da minha pequena cidade, com sua extensa e bela escadaria, por onde passávamos para chegar ao grande salão de festas, pista de danças contornada por mesas com toalhas de pano e cadeiras de assentos estofados.
No palco, em lugar de destaque, músicos tocavam as marchinhas para animar a festa. Era naquele salão que aconteciam os melhores bailes de debutantes, as boas festas de casamento e de quinze anos, as emocionantes bodas de prata e de ouro, diziam lá em casa. E os carnavais mais animados.
Acho graça quando lembro dos sapatos que eu usava, próprios para a folia, quase sem sola, presos aos pés com elástico, miniaturas daqueles que a irmã mais velha e suas amigas também usavam para “pular o carnaval”. Chamados de “marias moles”, estavam nos pés das foliãs de todas as idades.
Diversos tombos levei naquele parquê escorregadio, muito bem encerado na véspera, deslizando ao sabor do piso em parceria com meu par de “marias moles” douradas.
Amarrada ao pulso esquerdo, eu levava uma bolsinha de tecido, confeccionada para carregar confete e serpentinas. Tudo feito especialmente para a minha estreia nas festas do Rei Momo.
Fui vestida de baiana, a fantasia de nove entre dez meninas, preferida na época por ser o traje típico brasileiro. E assim também estavam quase todas as meninas da minha idade, mas ninguém imagine que éramos baianinhas iguais, havia diferenças nos detalhes mais importantes. Diga-se de passagem, cada variação criada pelo bom-gosto das nossas mães e irmãs mais velhas.
Na cabeça, desfilei um turbante floral, preso na frente com pequenas frutas artificiais, modernidade criada lá em casa, seguindo o estilo da famosa Carmen Miranda.
Daquele meu primeiro carnaval, com traje de “baiana estilizada”, ficaram as românticas lembranças da infância, de brincar de atirar confete e jogar serpentina, dos clubes e das marchinhas, da alegria feita de simplicidade. E a vontade de cantar “Lua, oh, lua, querem te passar pra trás...” que sempre tenho nesta época.
Nascida em fevereiro, dou asas aos pensamentos quando janeiro se apronta para ir embora. Penso no tempo como um cometa, carregando-me em sua cauda luminosa para mais um ano de vida.
E lá vou eu, universo afora, curiosa por novidades e mala cheia de lembranças, na cauda desse cometa chamado tempo.
Cristina André
Publicado em 25/1/20.
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